Morar Com The New York Times

Que tal voltar pra casa?

Revisitar seu lar da infância pode ser uma viagem feliz pela estrada da memória... ou uma experiência inquietante para você e os novos proprietários

Por: Ronda Kaysen, do The New York Times 24/10/2019 4 minutos de leitura
Crédito: Trisha Krauss/The New York Times

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Há alguns anos visitei o imóvel onde cresci. Não havia voltado desde que tinha 15 anos, mas lá estava eu num dia de viagem com meus pais e meu marido. Não seria divertido aparecer e dar uma olhada? O proprietário nos recebeu surpreso e grato. Entramos naquilo que outrora fora o saguão de uma estrutura típica dos anos 50, mas que agora era parte de um espaço amplo e aberto, sem paredes separando a sala de estar da sala de jantar e da cozinha. A dona da casa nos contou que já morava lá há alguns anos e estava entusiasmada para nos mostrar as mudanças que havia feito na estrutura. E tudo o que eu conseguia pensar era: aonde foi parar a nossa sala de jantar?

Espiei meu quarto da infância, agora o closet dela. “Eu costumava dormir aqui”, disse timidamente. Admito que o espaço foi um quarto fofinho, mas rendeu um closet muito bom. Caminhando pelo local, meu sentimento principal era de estar tentando limpar uma janela suja. Ah, certo! A porta que dá para o deck foi retirada da sala de estar, não da cozinha. E aquele corredor interminável para o quarto dos meus pais tinha, na realidade, apenas alguns metros de comprimento. Enquanto eu, atordoada, mostrava para meu marido o lugar que fora meu quarto de brinquedos, minha mãe checava os novos acabamentos mais de perto.

A proprietária mostrou orgulhosa como ela havia reformado o banheiro principal. “Tirei o azulejo antigo que alguém havia colocado.” Depois que nos despedimos e saímos, minha mãe desabafou. “Aquilo era um azulejo italiano caríssimo! O que ela tem na cabeça?” Ela também não estava satisfeita com a sala de estar de conceito aberto: “Isso foi um erro”. Enquanto eu estava alegre ao reviver minha infância, minha mãe estava checando as escolhas de reforma dos novos proprietários.

A experiência de visitar o lar da infância faz maravilhas se você está procurando uma viagem pela estrada da memória. Traz lembranças confusas e desarticuladas para o foco. Mas uma casa não é estática – os azulejos mudam, as paredes caem. Se você entrar em um imóvel que foi radicalmente alterado desde que viveu nele, as alterações podem fazer com que sinta que alguém apagou você da cena, especialmente se foi você quem tomou as decisões anteriores. Ou, se você é o proprietário que assumiu involuntariamente o papel de anfitrião da versão histórica que não existe mais, pode sentir que esses visitantes são intrusos tentando atrapalhar sua reivindicação pelo local que você chama de lar.

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Propriedade afetiva x propriedade formal

“Quem é o verdadeiro dono? O mais original? O que vem de mais longe? Ou o que vive lá agora?”, disse Gretchen Rubin, autor de vários livros, incluindo “Ordem exterior, calma interior”. “O que significa possuir uma casa?” Mas Rubin não está a salvo de ser acusada de deixar sua marca em espaços que antes eram dela. Depois que sua avó morreu, Rubin, que estava com 30 anos à época, pegou uma faca e esculpiu um corte em um armário embutido antes de sua família vender a casa onde ela havia passado tanto tempo. “Lembro-me de pensar que realmente gostaria de voltar e ver se essa marca ainda está aqui”, disse ela.

Com frequência queremos checar os lugares onde vivemos em algum momento. Um terço dos americanos adultos visitou seu lar da infância no que Jerry M. Burger – autor de “Retornando ao lar: reconectando com a infância” – descreve como um “fenômeno geral”. Podemos nos lançar nessa jornada porque queremos nos lembrar de nossa juventude – e que jeito melhor de fazer isso do que caminhando pela casa que não é mais nossa? Para a maior parte de nós, a experiência é positiva, desde que o imóvel ainda esteja intacto ou tenha alguma semelhança com o que parecia quando crescemos lá. Grandes mudanças feitas depois por outras pessoas geralmente nos deixam infelizes. E se você aparecer para descobrir que a casa foi demolida e substituída por outra, prepare-se para ficar arrasada.

“Tem uma necessidade de sentir que sua infância ainda existe na sua memória e é uma parte importante de você”, disse Dr. Burger, que é professor emérito de psicologia na Universidade de Santa Clara. Mas o que acontece quando alguém aparece na sua casa com lembranças afetuosas de um tempo anterior a você se mudar para lá? Você pode gostar de ouvir histórias sobre o que foi o imóvel ou pode achar a experiência desconcertante, como se alguém estivesse tentando reivindicar um lugar que é seu por direito.

Nos anos que se passaram desde que visitei minha antiga casa, minhas memórias de infância permaneceram intactas e separadas daquelas de quando estive lá novamente naquela tarde. Sim, eu me lembro da nova estrutura aberta, mas aquela versão não se liga às minhas lembranças do Dia de Ação de Graças que passamos em nossa sala de jantar aconchegante, com minha mãe passando pela porta de vaivém da cozinha carregando pratos quentes. Mesmo que ainda lembre vividamente daqueles azulejos italianos no banheiro dos meus pais, não consigo, ainda que me esforce, lembrar como ficou o novo banheiro depois da reforma. / TRADUÇÃO DE ELENA MENDONÇA

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