Morar Com The New York Times

Quem manda é o cachorro

Mesmo não querendo admitir, nossos animais de estimação costumam dar as ordens em casa, desde decisões sobre a decoração até onde moramos

Por: Ronda Kaysen, do The New York Times 27/11/2019 7 minutos de leitura
Crédito: Trisha Krauss

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Certas pessoas da minha casa – não quero dar nomes – estão realizando uma campanha furtiva e coordenada para conseguir um cachorro. Um deles pode deixar sugestões sutis quando passamos por um poodle particularmente fofo no parque, parando para acariciá-lo e demonstrando quão madura e capaz ela seria se uma criatura desse tipo se juntasse à nossa família.

Outro arquiteto desse esforço pode se enrolar no sofá e dizer casualmente algo como: “Mas não seria tão bom ter um pequeno jack russell aos seus pés? Ele pode fazer companhia enquanto você trabalha em casa”. Quando essa linha de argumentação cai por terra, ele pode acrescentar: “Eles não são muito grandes, não ocupam muito espaço”. Talvez eu nunca tenha morado com um cachorro, mas sei da verdade. Um cachorro, por menor que fosse, governaria nosso lar.

Alguns entusiastas de cães podem negar isso, dizendo que um cachorro é um animal de estimação fácil. Claro, você não precisaria limpar um aquário, esfregando as algas do vidro e sugando pedras poluídas. Mas estou pensando na minha casa, não apenas na rotina mundana de cuidar de animais de estimação. Se pensar direitinho, surge uma imagem mais ampla, onde o membro da família de quatro patas pede fotos na decoração.

Seu precioso yorkie começa confundindo o tapete de sisal com uma almofada de fazer xixi e, de repente, você percebe que trocou seu tapete por couro de vaca porque, por algum motivo inexplicável, seu cão não sujará a pele de outra criatura. Ou talvez sua cadelinha dachshund ansiosa não consiga lidar com um caixote, então você cede um quarto inteiro porque, bem, ela se sente mais relaxada em espaços maiores (não é assim?).

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É preciso fazer escolhas

A decoração é apenas o começo. Tente contrabandear um vira-lata para dentro de um prédio sem animais de estimação e verá que, depois de alguns meses se escondendo do síndico, você vai simplesmente fazer as malas e ir para um lugar com um concierge de animais de estimação. Não há como evitar: se levar um cachorro para sua casa, isso mudará a maneira como você vive nela. E isto é especialmente verdade se você vive na zona urbana, onde o espaço é pequeno e os cães estão por toda parte.

“Como humanos, geralmente esperamos que os cães entendam como viver conosco. Mas eles não chegam sabendo que não devem mastigar nem pular nas coisas. Eles estão apenas sendo cães”, explica Anna Ostroff, treinadora de cães associada da School for the Dogs, em East Village. “Ao optar por ser um pai de estimação, especialmente em Nova York, teremos que fazer algumas adaptações.” E essas adaptações podem ser substanciais.

Logo depois que Kelly Kreth levou uma dachshund para casa, em seu estúdio no Upper East Side, há 18 meses, ela percebeu que a filhote sofria de ansiedade de separação e não podia ser deixada sozinha ou presa. Então ela fez o que qualquer dono de animal de estimação dedicado faria e deu a Biggie Smalls seu escritório doméstico, instalando um portão de dois metros e meio na entrada. Kreth, 48 anos, publicitária, trabalha em casa e agora considera o sofá seu novo escritório. “Pensei que poderia colocá-la perfeitamente no meu apartamento, mas não tive tanta sorte.”

Kreth instalou uma câmera para monitorar Biggie nas raras ocasiões em que sai sem ela. O gerente de manutenção do prédio também ajuda, levando a cachorrinha para o subsolo quando ela se sente solitária. Em maio do ano passado, ele levou Biggie para casa com ele em Nova Jersey, enquanto Kreth esteve fora por uma semana. O prédio apoiou tanto as necessidades de Biggie que Kreth não cogita se mudar de lá. “Eu nunca mais posso sair daqui. Nem saberia por onde começar. E se todos os vizinhos me odiassem no prédio novo?”

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Claro, há muitos lugares para morar em Nova York onde os cães são bem-vindos. Dos 76.494 cachorros registrados voluntariamente na cidade em 2016, os três CEPs com mais animais foram agrupados no Upper West Side, de acordo com dados compilados pelo Localize.city, um site que fornece informações sobre qualquer endereço de Nova York. Mas mesmo em uma cidade amiga dos cães, você ainda pode ter que escolher entre seu amado apartamento e seu filhote.

Novas demandas

Por quase seis anos, Juan Rosales e Sam Litton viveram no tipo de apartamento que outros nova-iorquinos invejam: um enorme e relativamente barato. Pagavam US $ 2.400 por mês pelos espaçosos dois quartos em Vinegar Hill, Brooklyn. A política rígida de proibição de animais de estimação não foi um problema até que o casal adotou Hugo, um vira-lata, em outubro de 2017. “Era um ótimo apartamento”, diz Rosales, 40 anos, que trabalha para o departamento de educação da cidade. “Ainda estaríamos lá se não fosse pelo cachorro.”

Logo, eles estavam cronometrando as caminhadas de Hugo para evitar encontros com o síndico. Deram instruções ao passeador de cães sobre como manter a discrição. O que antes era um apartamento dos sonhos passou a não fazer mais sentido. Três meses depois da chegada de Hugo, o casal mudou-se para um apartamento de um quarto na 33 Bond Street, no centro do Brooklyn, com metade do tamanho anterior e a US $ 3.100 mensais. Mas, diferentemente de seus antigos condomínios avessos a cães, seu novo prédio oferece um cardápio de serviços que atendem animais de estimação, como encontros de cachorros, funcionários para passeios, banho e tosa, treinamento e até tratamentos faciais para cachorros – tudo fornecido pela Throw Me a Bone.

Rosales e Litton, dois advogados de 32 anos, também abraçaram completamente a vida em uma comunidade centrada em animais de estimação, onde os vizinhos têm mais probabilidade de saber o nome do seu cão do que o seu. “Não só não nos arrependemos, como também adoraríamos adotar um segundo cachorro”, conta Rosales. Um filhote novo, porém, excederia o limite de animais de estimação do edifício, o que significa que o casal teria que se mudar novamente. Mas qual preço seria demais a considerar se um filhote estiver envolvido?

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Obviamente, a vida de todos ao redor não deve ser prejudicada pela adoção de um cão. Se a campanha da minha família por um cachorro fosse bem-sucedida, não precisaríamos nos mudar e duvido que precisasse reformular algo, mas nunca se sabe. “Adotar um cachorro geralmente muda você de maneira que não esperava”, esclarece E’Lise Christensen, uma comportamentalista veterinária de Manhattan. “Todo cachorro é um novo relacionamento, assim como toda pessoa.”

Eu me conheço bem o suficiente para saber que, se trouxéssemos para casa um membro peludo para a família, eu me dedicaria e provavelmente acabaria como Moom Luu e Kate Anthony, um casal que vive em um apartamento de dois quartos em Ridgewood, Queens, com seu pequinês de 11 anos. McGee “é o dono de nossa casa e nós somos apenas sua equipe”, afirma Luu, 45 anos, que trabalha com impressão e produção digital.

Três meses atrás, eles desistiram do sofá de couro Mitchell Gold + Bob Williams de US $ 5.000 porque McGee, que tem problemas nas costas, não podia mais saltar com segurança para ele. O novo sofá, que é mais baixo e feito de tecido áspero, é menos confortável para a senhora Anthony, que tem 51 anos de idade e 1,75m de altura. Mas ela está disposta a tolerar o arranjo estranho, o que não é surpreendente, considerando que a cama do casal tem uma rampa e é cercada por um portão de madeira para facilitar a vida de McGee.

“Parece um berço gigante”, conta Luu. “É uma chatice, mas não há nada que possamos fazer.” Sei de algo que poderíamos fazer: não adotar um cachorro. Como alguém que já entregou grande parte da casa e da vida a pessoas muito menores do que eu, não estou pronta para abrir mais espaço para outra criatura miúda. Pelo menos não ainda. / TRADUÇÃO DE ELENA MENDONÇA

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