[OPINIÃO] Plataformas de hospedagem: limites da liberdade de preço e o papel regulatório do Estado
Marcelo Kowalski Teske é sócio do Bornhausen & Zimmer Advogados

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A recente movimentação dos órgãos de proteção ao consumidor frente às situações de preços de hospedagem durante a COP 30 reacende o debate sobre a definição de preços por anunciantes e os limites de responsabilidade das plataformas digitais intermediadoras.
Nas plataformas de hospedagem, a definição de valores não é feita pela empresa intermediadora, mas, sim, pelo próprio anfitrião ou hotel. Essas plataformas atuam como agências digitais de viagens (OTAs), conectando consumidores a prestadores de serviços independentes. As fotos, descrições e características do imóvel ou hotel são de responsabilidade exclusiva do anunciante, assim como a estratégia de preço. A plataforma apenas faz refletir as informações dos proprietários de hotéis e outras acomodações.
Em períodos de alta demanda, como grandes eventos ou temporadas turísticas, a lógica de mercado segue a lei da oferta e da procura. Não há limites legais fixos para reajustes, o que permite que proprietários pratiquem preços até três vezes superiores à média. A fiscalização sobre práticas abusivas, quando existente, cabe a órgãos públicos de defesa do consumidor, como Procon e Senacon e até mesmo ao Ministério do Turismo, e não às plataformas.
Juridicamente, as plataformas não são responsáveis pela definição de preços, pois não há nexo de causalidade entre sua atuação e a conduta do anunciante. A analogia com o iFood ajuda a ilustrar: se um restaurante decide cobrar valores elevados por um prato, a plataforma não pode ser responsabilizada por essa escolha comercial.
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A obrigação das OTAs é garantir transparência, informando de forma clara e objetiva os preços e condições oferecidas, mas não lhe cabe interferir na estratégia comercial de cada acomodação.
O Código de Defesa do Consumidor prevê que o fornecedor deve garantir informações adequadas e claras sobre produtos e serviços. Contudo, ainda não há jurisprudência consolidada no Supremo Tribunal Federal (STF) ou no Superior Tribunal de Justiça (STJ) que imponha às plataformas digitais a fiscalização ativa de preços. Nos casos analisados até o momento, a tendência é reconhecer a responsabilidade direta do anunciante, e não da intermediadora.
Apesar de não interferirem nos preços, as plataformas mantêm diálogo constante com órgãos de defesa do consumidor, como Senacon e Procon, para tratar de reclamações e assegurar padrões de atendimento. Em situações em que há falha atribuível à plataforma, como problemas de cobrança ou falta de suporte ao usuário, acordos administrativos costumam garantir a reparação ao consumidor.
Após a notificação, as plataformas devem cumprir a exigência formal de alertar os anunciantes e retirar ou corrigir anúncios questionados, embora a ingerência sobre os preços em si não lhes caiba. A competência para regular aumentos excessivos e evitar abusos recai sobre o Ministério do Turismo e órgãos de defesa do consumidor.
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O episódio mostra como a digitalização das relações de consumo desafia as fronteiras tradicionais do Direito. Se, de um lado, a liberdade de preços é inerente ao modelo de mercado, de outro, cabe ao Estado coibir abusos e proteger o consumidor. As plataformas digitais, enquanto intermediárias, têm papel importante na transparência e na mediação de conflitos, mas não podem substituir a função fiscalizatória do poder público e serem responsabilizadas por situações que não lhes cabe agir.
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