[OPINIÃO] O fim do compulsório é a solução que o mercado imobiliário precisa?
Amadeu Mendonça é advogado especializado em negócios imobiliários e planejamento patrimonial e sucessório.

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A Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc) tem defendido a abolição total do depósito compulsório sobre a poupança, sob o argumento de que isso destravaria o crédito imobiliário. Até então, a entidade propunha reduzir a obrigatoriedade estabelecida pela política monetária de 20% para 15%, o que já liberaria cerca de R$ 35 bilhões hoje depositados em reserva.
Com o novo posicionamento, sugere substituir integralmente esse encargo por uma linha de “redesconto” oferecida pelo Banco Central ao mesmo custo da poupança, com garantia em títulos públicos, para destinar 100% dos recursos a financiamentos habitacionais.
O depósito compulsório é a parte dos recursos captados que o BC retém em sua conta junto aos bancos – 20% dos saldos médios diários da poupança -, remunerando-os na mesma condição dos poupadores. Na prática, serve para ajustar a liquidez no mercado, reforçar a estabilidade do sistema financeiro e contribuir ao controle da inflação. Qualquer mudança no percentual ou na forma de cumprimento altera diretamente o volume de crédito disponível e seu custo.
Além disso, a legislação obriga que pelo menos 65% dos depósitos de poupança sejam aplicados no Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE), voltado ao financiamento habitacional. Após o direcionamento desse percentual e o recolhimento compulsório, os 15% restantes ficam disponíveis para livre utilização das instituições.
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O compulsório também funciona como colchão de liquidez. Segundo a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), ao divulgar a Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (Peic), 78,4% das famílias estão endividadas e 29,5% estão com contas em atraso. Se os mutuários não conseguirem honrar as parcelas e os poupadores, ao mesmo tempo, correrem para sacar seus recursos, a ausência de compulsório torna quase inevitável um descompasso entre saques e disponibilidades.
Para mitigar esse risco, chegou-se a propor uma linha emergencial de crédito do BC. Mas o Banco Central não atua no varejo: seus recursos provêm da emissão de moeda lastreada em títulos públicos. Aumentar rapidamente o volume desses títulos eleva a oferta de moeda e pressiona a inflação, corroendo o poder de compra das famílias.
Com a inflação em alta, o risco de investir em títulos públicos aumenta e o governo e o BC são “obrigados” a elevar a remuneração desses papéis e, por extensão, a taxa Selic, a patamares ainda mais elevados.
Outra limitação prática é que não há garantia de que os adquirentes aplicarão esses recursos na compra de imóveis novos, parte significativa pode ser direcionada ao mercado secundário, o que pouco incentiva a atividade da construção, justamente o efeito pretendido pela Abrainc.
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Em suma, embora abolir o compulsório pareça uma medida atraente no curto prazo, no médio prazo ela expõe o sistema financeiro a choques de liquidez e empurra a economia para um ciclo de inflação e juros altos, prejudicando tanto o mercado imobiliário quanto o consumidor final.
O mais importante agora é que o governo promova um ajuste fiscal contundente, reduzindo o déficit e a pressão inflacionária, e revise a carga tributária para torná-la compatível com o crescimento econômico. Ao restabelecer o equilíbrio das contas públicas, o Banco Central ganha espaço para controlar a inflação sem sacrificar o crédito, abrindo caminho para juros mais baixos, condições normais de mercado e benefícios concretos ao setor imobiliário, às famílias, às empresas e à população.
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