“Empregabilidade dos operários está mais segura que a dos engenheiros”, diz Lucio Soibelman
Com projetos na NASA e com o exército norte-americano, professor de universidade da Califórnia afirma que conhecimento em dados já é mais importantes que tempo de experiência
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Em um dos painéis do Construsummit, evento de gestão e tecnologia voltada para a construção civil, Lucio Soibelman, professor da University of Southern California, nos Estados Unidos, alertou para a importância da reciclagem e do aperfeiçoamento contínuo no mercado de construção. Segundo ele, conhecimento de dados e tecnologia são demandas obrigatórias para um profissional do setor.
Nesta entrevista exclusiva, Lucio, que vive há mais de 30 anos nos EUA, fala de inteligência de dados, as diferenças da construção no Brasil e os projetos que está desenvolvendo em parceria com a Agência Aeroespacial dos Estados Unidos (Nasa) e com o exército americano.
Como a robótica e a inteligência artificial vão entrar no mercado de construção?
Os engenheiros precisam entender que alguns empregos vão desaparecer e outros irão surgir. Eles não podem ficar parados, achando que estão seguros. É necessário se reciclar e se preparar para quando essa transformação acontecer. É por isso que os operários estão mais seguros que os engenheiros. Os equipamentos de obra do futuro estão sendo desenvolvidos de uma maneira que você não precisa ter PHD para operar. É muito mais fácil reciclar um operário para trabalhar com um robô de demolição do que reciclar um engenheiro de orçamentação para fazer inteligência artificial e análise de custos de obras.
Depois de tanto tempo acompanhando o mercado norte-americano, na sua opinião, o que o diferencia do brasileiro?
Não acho que o Brasil esteja atrasado em relação aos Estados Unidos. São mercados diferentes. Nos EUA, a construção de edifícios não é tão comum e, com algumas exceções, como Nova York e Chicago, as pessoas vivem mais em subúrbios. E essas casas são construídas com materiais pré-fabricados, sem engenheiros.
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Além disso, o mercado brasileiro é mais distribuído. Nos EUA, é comum que as empresas sejam maiores, mas em menor quantidade do que no Brasil. Ou seja, elas têm bem mais capital para investir. Isso permite que aconteçam mais investimentos. O BIM (Modelagem de Informação da Construção), por exemplo, está bem mais avançado nos EUA do que aqui. No Brasil, uma construtora pequena, fundada no interior, conta com um engenheiro, uma caminhonete e uma betoneira, e não tem o capital e o tempo para desenvolver essas coisas. Mas não acho que elas estejam erradas em não inovar.
Qual é o seu objeto de estudo atualmente na University of Southern California?
Basicamente estudo banco de dados na construção. Desde a maneira que se administra o projeto até a infraestrutura do empreendimento. Esse é um mercado que tem poucos dados, por isso é comum que as decisões dependam muito do engenheiro. Isso porque ainda existe a ideia de que a experiência sobrepõe os dados. Mas a realidade é diferente. Os dados falam por si só. Se eu perguntar a um engenheiro quanto tempo demora para construir uma parede, ele me responde de bate-pronto: dois dias. O que isso significa na prática? Que a pessoa construiu 1 mil paredes e tem o sentimento de que aquela construção também vai durar dois dias.
Basear a decisão em dados é outra coisa. Significa que vou analisar 10 mil paredes similares a essa que foram construídas. Também sei que a construção mais rápida demorou 1,2 dias e a mais lenta demorou 3,5 dias – e isso porque aconteceu em um dia chuvoso. É possível prever, então, que vai demorar 1,8 dias porque tenho os dados para justificar.
Como você aplica o conceito de dados no projeto desenvolvido com o exército norte-americano?
Pense em uma câmera que tira diversas fotos para criar um modelo 3D. A precisão não costuma ser tão grande. Uma porta, por exemplo, pode ter um erro de 3 cm. Existem, então, alguns equipamentos que utilizam laser para mandar feixes de luz na parede e de acordo com o tempo que ele demora para ir e voltar, eu consigo criar modelos da parede com qualidade milimétrica. O exército atualmente já usa essas câmeras para ter modelos 3D em que você consegue até interagir e olhar. O problema é que numa zona de guerra, o pelotão não tem condições computacionais de fazer isso. Tudo o que ele tem é um laptop e um drone.
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O que minha equipe de pesquisa se propõe é fazer com que essa transferência da fotografia para o modelo 3D em tempo real seja mais eficiente e demande bem menos capacidade computacional. Além disso, aferimos os objetos observados. Se eu disser para um soldado que ele pode se esconder atrás de uma parede, preciso aferir se aquela parede é de tijolo ou de vidro. E para isso temos a inteligência artificial.
E como é este projeto com a Nasa?
É um projeto de construção na lua. Hoje, é necessário ter locais para aterrissar os foguetes. Eles não podem simplesmente pousar no solo e jogar detrito para tudo quanto é lado, correndo o risco de destruir os módulos lunares. Por outro lado, se a aterrissagem for muito longe, você tem o trabalho de levar tudo de onde o foguete está até o lugar em que esses objetos precisam estar.
Ou seja, além de achar um local com uma distância boa o suficiente para construir um ponto de aterrissagem, é preciso construir o ponto, as estradas e os módulos. Nosso projeto envolve todo esse processo. Desde a escavação e a movimentação de materiais até a impressão de uma mistura termostática com o solo da lua.
É importante dizer que isso não significa que será aplicado na prática. Quando a Nasa faz um edital para financiamento de pesquisa não significa que ele será usado. Existe uma série de projetos desenvolvidos por dezenas de universidades e empresas sendo analisadas e testadas ao mesmo tempo. E a única obrigação é que essas soluções também tenham uso na Terra.
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