Tanto tempo sem abraçar os familiares, sem reunir os amigos e, o que é pior, sem encontrar o crush, faz a gente começar a ter ideias. Pensando nisso, a prefeitura do Rio de Janeiro deu aquele empurrãozinho que faltava para quem está à procura de um novo amor: delivery para incentivar a adoção de cães e gatos durante a pandemia. Os 900 animais disponíveis foram resgatados de situações de abandono e maus-tratos e aguardam um lar definitivo.
Mas o incentivo só veio reforçar a tendência. Em São Paulo, o projeto Enquanto Houver Chance sentiu o aumento do interesse. Para efeito de comparação, nos meses de março, abril e maio de 2019 o projeto intermediou nove adoções de gatos. No mesmo período deste ano já foram 22 e o mês de maio ainda está na metade. Mas não foi só a quantidade que mudou. As pessoas estão mais sensíveis a casos de animais fora dos padrões antes buscados: pelagem clara, filhotes e perfeitos.
“Muitas pessoas estão, surpreendentemente, dando chance a gatos adultos, com pelagem colorida ou que precisam de cuidados com a saúde, o que é sensacional. São gatos que, em circunstâncias normais, não teriam sido notados por ninguém”, conta Juliana Santana da Rocha, 36 anos, idealizadora do Enquanto Houver Chance. O esforço de Juliana é voluntário. Trabalhando com a causa de animais abandonados há 14 anos, há 3 resolveu criar o próprio projeto, que atua majoritariamente com gatos e está situado na zona sul da capital paulista.
“Há mais procura pelas adoções, mais pessoas estão entrando em grupos à procura e recebemos pedidos que não conseguimos mais atender.” Agora com sete gatinhos em processo de intermediação, o projeto chegou a atender até 52 felinos ao mesmo tempo, muito acima da capacidade, já que antes de serem disponibilizados os bichos são vacinados, castrados, vermifugados e até passam por procedimentos cirúrgicos, quando necessário.
A Graviola foi uma das gatinhas resgatadas que ganhou uma casa nova durante a pandemia do novo coronavírus. Adulta, tricolor e aguardando adoção desde setembro do ano passado, Graviola agora mora com Ana C. Costa, 35 anos, autônoma. “Eu já tinha vontade de adotar, mas essa decisão tem a ver com a quarentena. O meu ritmo de trabalho diminuiu, estou em casa, posso fazer tudo com mais calma. E quando a vida normalizar eu não vou querer voltar para o mesmo ritmo de antes. A adoção do gato tem a ver com isso, essas outras coisas que quero incluir no meu dia, no meu tempo de vida.” Ana conta também que se sente privilegiada por poder reduzir sua jornada de trabalho sem preocupações e, por isso, gostaria de colaborar com a sociedade de alguma forma. “Eu penso no quanto a gente precisa fortalecer nosso papel enquanto comunidade. De que maneira poderia ajudar? Por isso eu quis adotar um bichinho que estivesse precisando de um lar.”
Burocracia para evitar fogo de palha
Graziele Adriane B. da Cruz, de 24 anos, também atua voluntariamente no próprio projeto, AdotarÉChic. Coordenadora de produção gráfica na área de cinema, ela também coordena cuidados com “peludinhos” (gatos e cachorros) resgatados, que distribui entre abrigos particulares e lares temporários até que recebam um lar definitivo. E confirma a tendência de alta da demanda durante o período de isolamento social. Foram 22 adoções entre 14 de março e 15 de maio de 2019. Já entre 14 de março e 15 de maio de 2020, foram 51, o que significa aumento de 132%. “Fiquei com receio quando vi o boom da procura. Mas eu sempre tive um processo de adoção bem burocrático e responsável, feito por entrevista, questionário, envio das fotos do local, visita, aproximação forte com os interessados e apresentamos as consequências de possíveis devoluções. São vidas.”