O Brasil tem 413 mil pessoas com mais de 1 milhão de dólares, de acordo com o relatório Global Wealth Report 2023 (Relatório de Riqueza Global 2023), divulgado pelo banco Credit Suisse e pelo UBS. Em um País de 212 milhões de habitantes, os milionários representam apenas 0,19% da população. Na realidade deste seleto grupo, a transação de imóveis respeita configurações particulares e curiosas.
A revista Fortune define que os ultrarricos são aqueles com pelo menos 50 milhões de dólares na conta (cerca de R$ 284 milhões). Apesar de discrição ser um substantivo que passa distante das mansões e coberturas de luxo habitadas por este público, eles se esforçam para não chamar a atenção na hora de comprar e vender seus imóveis.
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Especializado no mercado imobiliário de luxo, o corretor Elizeu Almeida explica que a maior parte das negociações acontece off market, ou seja, longe de sites especializados ou anúncios publicitários. “O cliente não quer exposição dos seus ativos. Muitos deles são ou têm ligações com políticos, personalidades e grandes empresários”, pontua.
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“Como o mercado de luxo no Brasil é muito pequeno e restrito, eles estão a dois ou três telefonemas um dos outros. Isso aumenta o nível de complexidade. Um dos nossos papéis é intermediar essa negociação sem evidenciar o vendedor e o comprador”, relata Almeida.
Em maio de 2023, o bilionário brasileiro Leo Kryss, cofundador da fabricante de brinquedos Tectoy, vendeu uma mansão por 79 milhões de dólares (cerca de R$ 450 milhões) em Indian Creek, uma ilha da Flórida conhecida por abrigar bilionários e celebridades.
O que o empresário não sabia é que o comprador era Jeff Bezos, fundador da Amazon e terceira pessoa mais rica do mundo.
De acordo com Wall Street Journal, Kryss entrou com um processo contra Jay Parker, seu corretor imobiliário, por tê-lo incentivado a aceitar a proposta com um desconto de 6 milhões de dólares (cerca de R$ 34 milhões) sem contar quem era o verdadeiro interessado.
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Kryss alega que a falta de transparência quanto à identidade do comprador o levou a aceitar um valor inferior ao que poderia ter obtido, resultando em um prejuízo milionário. Parker conta que ele mesmo também não sabia que a propriedade seria de Bezos, pois o prefeito da ilha teria fingido ser o comprador.
Fato é que este tipo de negociação não é exatamente uma novidade entre os ultrarricos. “Quando o vendedor da casa descobre quem está interessado, tem a tendência a aumentar o preço para obter vantagem na venda. Nestes casos, é função do executivo imobiliário blindar as informações para que a negociação aconteça da melhor forma possível”, explica Almeida.
Almeida se especializou na venda de mansões na Fazenda Boa Vista, um condomínio de luxo desenvolvido pela JHSF e localizado em Porto Feliz, município paulista a cerca de 100 quilômetros da capital do estado.
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Com direito a quadras de tênis, dois campos de golfe, dois campos de polo, centro equestre e até um shopping particular, o condomínio tem imóveis que custam de R$ 30 milhões a R$ 300 milhões.
Na área de 12 milhões de metros quadrados, o condomínio abriga mansões de famílias quatrocentonas, sobrenomes tradicionais, banqueiros e fundadores de empresas. Além da Fazenda Boa Vista, outros condomínios de luxo se destacam no interior de São Paulo por atrair o público ao oferecer mordomias que apenas os ultrarricos podem pagar, como a Quinta da Baroneza, a Fazenda da Grama e o Haras Larissa.
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“É um segmento conhecido pela exclusividade”, aponta o corretor de imóveis. “Metade dos meus clientes também têm propriedades em Miami, Paris ou Nova York. Grande parte vai para os Alpes suíços esquiar todo final de ano”, ilustra. “O que o milionário vai fazer no final de semana em São Paulo? Ele vai pro shopping?”, ironiza Almeida.
O dinheiro não é nem de longe um problema para este público, mas os compradores não costumam entrar nas negociações para perder. O imóvel é uma forma de qualificar e diversificar seus investimentos. “Eles enxergam como um ativo imobiliário. É muito difícil que ele aceite pagar mais do que o valor do imóvel. Querem que a valorização esteja, no mínimo, acima do CDI”, aponta.
“Se colocar dois machos alfas para negociar, ambos vão querer o melhor para si e será difícil chegar a um acordo. Meu papel é de intermediador, de conduzir a fogueira das vaidades”.
Em contrapartida, essas são famílias com muita liquidez. Ou seja, elas não têm exatamente pressa para fechar o negócio, pois não precisam dos recursos a curto ou médio prazo. “As negociações para a venda de uma propriedade demoram de seis meses a dois anos”, relata o executivo.
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Mesmo na hora de pagar, o natural é que as pessoas não tirem muito dinheiro da conta bancária. A maior parte das negociações, comenta o corretor, são por meio de permuta. Famílias cujos filhos saíram de casa e querem um imóvel menor, que aumentaram com a chegada de netos ou que estão mudando de País são alguns dos perfis tradicionais deste processo.
“Tenho uma carteira com 300 clientes e geralmente eles compram e vendem entre si. Muitas vezes o acordo envolve uma troca de propriedades e uma das partes combina com o outro de pagar a diferença em ‘parcelas de R$ 1 milhão’”, comenta Almeida.