[Opinião] O canteiro esvaziou. E agora, quem vai construir o futuro?
Cristiano Gregorius

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A construção civil atravessa uma fase de transformação profunda, impulsionada por desafios que vão muito além das obras propriamente ditas. A escassez crônica de mão de obra qualificada, problema este que se arrasta há décadas, já não pode mais ser ignorada como uma consequência natural do setor. É um gargalo que ameaça o crescimento sustentável da indústria e levanta uma questão crucial: por que os mais jovens não querem trabalhar na construção civil?
Os dados demonstram a urgência da mudança: segundo levantamento da Sondagem da Construção, realizada pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV IBRE), 82% das empresas reportam dificuldades na contratação de profissionais.
Além disso, dados da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC) revelam que a média de idade dos trabalhadores aumentou nos últimos anos — de 38 anos, em 2016, para 41 anos em 2024 — e apenas 30% deles possuem qualificação técnica formal.
A resposta passa por um olhar sincero e provocador. Muitos desses jovens seguem o mesmo caminho de seus pais, que também evitaram ou deixaram o setor após experiências marcadas muitas vezes por baixos salários, falta de reconhecimento e condições precárias de trabalho.
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Para romper esse ciclo, não basta apenas investir em tecnologia. O setor precisa se reinventar, precisa voltar a ser atrativo. Para além disso, precisa ser percebido como um ambiente disruptivo, inovador e capaz de atrair novos talentos com promessas reais de carreira, impacto e propósito.
É inegável que a transformação tecnológica está em curso. Robôs colaborativos, sensores inteligentes e sistemas de inteligência artificial já fazem parte da rotina de algumas obras. Equipamentos de proteção com dispositivos embarcados monitoram em tempo real o avanço físico dos projetos, enquanto plataformas digitais otimizam processos como orçamentação, cronogramas e controle de qualidade.
Mas nenhuma dessas soluções é eficaz sem pessoas preparadas para administrá-las.
E aí está outro ponto crítico: tecnologia tem potencial transformador, mas só ganha força real nas mãos de pessoas capacitadas. O desenvolvimento de competências técnicas e digitais deve deixar de ser um complemento e se tornar prioridade estratégica.
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É preciso formar profissionais capazes de trabalhar em colaboração com máquinas, sim, mas que também saibam liderar a inovação. O futuro da construção não é automatizado. Ele é híbrido, humano-tecnológico.
Rever a atratividade do setor é urgente. Se o setor já não atrai novos talentos, talvez o desafio esteja menos nas pessoas, mas em como comunicamos o valor da indústria. O setor precisa oferecer mais do que empregos: precisa oferecer carreiras, reconhecimento, segurança e qualidade de vida. Salários adequados, programas consistentes de capacitação, ambientes saudáveis e políticas justas de trabalho devem ser regra e não exceção.
A famosa imagem “Almoço no topo de um arranha-céu”, registrada por Charles C. Ebbets em 1932, mostra operários almoçando sobre vigas de aço a quase 260 metros de altura, sem qualquer equipamento de proteção. Ícone do século XX, ela simboliza uma era de bravura, mas também de negligência. Hoje, temos tecnologia suficiente para que essa cena jamais se repita. A construção civil moderna precisa deixar claro: segurança não é um luxo. É um direito e uma obrigação.
Estamos diante de uma oportunidade histórica. A construção civil foi, por muitos anos, o setor que alavancou economias, ergueu cidades e realizou sonhos e, a meu ver, continua sendo. É hora de resgatar esse legado. Mais do que erguer estruturas, precisamos reconstruir a imagem do setor — torná-lo novamente um espaço desejado, moderno e promissor para os novos trabalhadores.
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A construção civil do futuro não será feita apenas de concreto e aço, mas de pessoas qualificadas, inspiradas e bem cuidadas. Se queremos atrair os novos talentos que farão essa nova era acontecer, temos que transformar o setor em algo onde todos queiram estar, e se orgulhem de construir.
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