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Entenda a relação entre a sua casa e a sua saúde

Arquitetura de ambientes pode influenciar positiva ou negativamente os transtornos mentais/ Crédito: Getty Images
Breno Damascena
07-10-2022 - Tempo de leitura: 6 minutos

Com as horas cada vez mais corridas, o cuidado com a saúde mental ultrapassou as barreiras da psicologia para se tornar um tema relevante no trabalho, no esporte, na alimentação e em inúmeros outros setores. E isso não é diferente no mercado imobiliário. O desenvolvimento de iniciativas focadas no bem-estar dos moradores, como o wellness building, são frutos dessa preocupação. 

Da Declaração Universal de Direitos Humanos a propostas de políticas públicas, a habitação é o centro de importantes debates que envolvem toda a sociedade. É da importância do lar que surgem movimentos focados em entender o impacto dos ambientes na saúde da população e empreendimentos que utilizam a arquitetura como ferramenta para melhorar a qualidade de vida dos cidadãos. 

“Nossa casa, cidade e escritório são os lugares em que passamos mais tempo. É natural que exerçam muita influência nos nossos sentimentos e emoções”, reflete Andréa de Paiva, especialista em neuroarquitetura e idealizadora do NeuroAU, projeto para debater as conexões entre ciência cognitiva e arquitetura, design e urbanismo. “Em geral, as pessoas pensam apenas na questão estética ou na funcionalidade do ambiente, mas ele interfere para além do que se nota conscientemente”, aponta. 

Impacto do design ativo

Andréa explica que as construções são capazes de afetar comportamentos, tomadas de decisão e até hábitos cotidianos. Como exemplo, ela cita o design ativo, um conceito da arquitetura que propõe a criação de espaços que incentivam a prática de exercícios físicos e uma rotina mais saudável. É de onde vem propostas como a de estimular o uso da escada padrão em vez da escada rolante, por exemplo. 

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Uma experiência conduzida pela Volkswagen em uma estação de metrô de Amsterdam trocou os degraus por teclas de piano como forma de estimular que mais pedestres escolhessem subir de escada. Essa simples mudança fez com que o uso dela aumentasse 66% durante o período. Depois do resultado positivo, vários países executaram ideias parecidas, inclusive o Brasil. 

Vídeo mostra como escada “transformada” em piano incentivou pedestres a largarem escada rolante/ Crédito: The Fun Theory 1 – Piano Staircase Initiative | Volkswagen | Youtube

A arquiteta afirma que todas as características que compõem uma residência podem causar efeitos na saúde mental. Morar em uma casa com muitas janelas ou ter uma varanda em casa aumenta a incidência de iluminação natural, o que provoca um aumento na produção de serotonina, conhecida como hormônio do bem-estar e que ajuda a regular o sono, melhorar o humor e até o apetite. 

“Hoje, com o home office, muitas pessoas não caminham mais ao ar livre nem para ir à parada pegar um ônibus, o que diminui consideravelmente a nossa exposição à luz do sol”, justifica Andréa. “Isso é notado, também, pelas mudanças das cidades, com cada vez mais prédios fazendo sombras e menos iluminação natural. Essa discussão é importante para arquitetos e urbanistas”, acrescenta. 

Construindo ambientes mais saudáveis

Esse efeito dos espaços no bem-estar é notado em diversas outras características que norteiam desde a construção dos layouts de apartamentos até a urbanização de cidades. “A formação dos ambientes é capaz de interferir na qualidade do ar, na poluição sonora e luminosa, no odor que chega às residências e no contato da população com o meio ambiente”, explica.

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“A presença da natureza ajuda as pessoas a relaxarem, enquanto o excesso de luz artificial em determinadas horas do dia atrapalha a produção de melatonina, o que atrapalha o sono. Já a poluição sonora aumenta a produção de cortisol, conhecido como ‘o hormônio do estresse’”, enumera Andréa. “Mesmo os pequenos estímulos multissensoriais criados pelos ambientes afetam o nosso bem-estar”, aponta.

Nós moldamos nossos prédios, e depois são eles que nos moldam

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Winston Churchill

Wellness Building como solução para o estresse

Durante a pandemia, com as pessoas presas mais tempo dentro de casa, tornou-se alarmante o número de indivíduos declarando transtornos mentais. Para se ter ideia, um levantamento realizado pelo LinkedIn no período mostrou que 62% das pessoas ficaram mais ansiosas e estressadas com o trabalho e 72% dos jovens profissionais sentiram prejuízos no aprendizado de habilidades comportamentais.

Não à toa, surgiram questionamentos sobre o quanto as residências estariam ou não preparadas para as pessoas e suas demandas de saúde mental. Amplificou-se, daí, a vontade de viver em um lugar com condições mais saudáveis. Neste contexto, o conceito de wellness building ganhou força no mercado imobiliário e vem se consolidando como um negócio milionário. 

 O wellness building é a ideia de construir um prédio residencial tendo como pilar principal a preocupação com a saúde e o bem-estar dos moradores. “O maior fator de risco que você tem é o seu CEP”, arremata Andressa Gulin, head de inovação na AG7, incorporadora brasileira focada no setor. “A depender de onde e da maneira que você mora, a sua vida é bem diferente”, comenta.

Graduada em medicina, ela encontrou no mercado imobiliário uma oportunidade para promover essas melhorias. “Baseamos nossas construções nos pilares de saúde ambiental, física, mental, financeira, social, ocupacional e espiritual”, enumera. “Não queremos construir prédios pensando no número de quartos, mas, sim, nos hábitos que vamos incentivar nos nossos moradores”, adiciona. 

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Essa concepção se traduz em transformações visíveis nos empreendimentos, como jardins suspensos, salas de yoga, academia, paisagismo, espaços multifuncionais e até clubes de literatura. “A gente pensa nos detalhes para construir um ambiente em que as pessoas se sintam acolhidas e cuidadas. Dessa forma, criamos um prédio vivo”, acredita Andressa. 

Empreendimentos da AG7 priorizam contato com a natureza, pontos com grande incidência de luz e mobiliários em linhas retas/ Crédito: Divulgação AG7

Negócio milionário

Levantamento realizado pela Global Wellness Institute, com suporte da própria AG7, indica que o wellness real estate movimentou US$ 49 milhões no Brasil em 2020 e  US$4,4 trilhões no mundo. Isso é explicado pelo perfil do público que tradicionalmente vive em ambientes planejados dessa forma. Um apartamento vendido pela AG7, por exemplo, custa, em média, R$ 3 milhões.

O estudo também mostra que o segmento apresenta viés de crescimento. A própria AG7 já tem planos de expansão para, no futuro, realizar lançamentos em cidades litorâneas. Por enquanto, a companhia, que deve fechar o ano com R$ 50 milhões de faturamento, foca seus esforços na região de Curitiba. “As cidades são cansativas e estressantes. Quanto vale dormir bem?”, questiona Alfredo Neto, sócio da empresa. 

Cuidados Pessoais e Beleza$34,382.3
Alimentação saudável, nutrição e emagrecimento$22,558.8
Saúde pública, prevenção e medicina personalizada$10,861.5
Atividade Física$8,860.8
Turismo de Bem-Estar$2,183.9
Bem-Estar Mental$1,943.9
Medicina Tradicional e Complementar$870.8
Bem-Estar no Ambiente de Trabalho$507.7
Spas$492.5
Águas Termais/Minerais$412.5
Bem-Estar Imobiliário$49.0
Fonte: Global Wellness Institute, baseado na extensa pesquisa primária e fontes de dados secundária