O que é taxa Selic? È a taxa básica de juros brasileira, tem muitos efeitos no dia a dia do consumidor, assim como as taxas de juros básicas determinadas pelas autoridades monetárias em todo o mundo. É possível dizer que ela funciona como principal instrumento de controle da inflação.
Um deles, a taxa de juros de crédito, tem relação com a casa própria: quando os juros estão em baixa, muitos brasileiros aproveitam para financiar imóveis, por conta do menor custo de crédito cobrado pelos bancos.
Quando esse efeito é contrário, o crédito fica mais caro, há menos concessão, o que freia o mercado imobiliário residencial de compra e venda e os investidores passam a aplicar seu dinheiro em renda fixa, que oferece retornos maiores que o mercado imobiliário que fica entre 7% ao ano.
Para entender melhor essa dinâmica, Pedro Tenório, economista da DataZAP+, braço de inteligência do ZAP+, explica a funcionalidade da Selic, que alcançou recentemente 9,25%, e como a alta impacta na aquisição da casa própria.
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“É o que chamamos de taxa básica de juros brasileira. Taxa básica, porque ela é um custo comum a todas as operações bancárias de crédito, ou seja, para a mesma operação de crédito, quanto maior for a taxa Selic, maior o custo incorrido pelo banco”, diz.
Para entender o nível recente dataxa Selic é necessário voltar à 2015 e 2016. A crise econômica resultou da insustentabilidade fiscal que alcançamos ao fim de 2014. A interpretação padrão é de que o ciclo virtuoso dos anos 2000 se esgotou já no fim da década e o governo passou a usar o gasto público para impulsionar o crescimento econômico. Desta forma, ao fim de 2014, a dívida pública tinha crescido fortemente, enquanto não houve contrapartida significativa em termos de crescimento econômico.
O aumento do gasto público sem contrapartida produtiva implicou em aumento do nível da inflação. Por isso, em 2015 e 2016, a taxa Selic foi elevada rapidamente para conter a inflação. Somou-se à crise fiscal, questões políticas e também uma crise de credibilidade econômica devido ao quadro institucional que controla as decisões de gasto público no País.
Com o Teto de Gastos aprovado no 2º semestre de 2016, a questão institucional sobre as perspectivas fiscais apontou uma melhora. No entanto, a medida apenas estancou a crise. Ainda faltava resolver o esgotamento do ciclo de crescimento dos anos 2000. O consenso é de que as famosas reformas estruturais são o caminho para um novo ciclo de crescimento.
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Devido à fragilidade política em que os governos se encontravam, relativamente poucas reformas estruturais foram para frente. Entre elas, temos o próprio Teto de Gastos, a Reforma da Previdência, a Reforma Trabalhista e os marcos regulatórios, dos quais se destaca o do Saneamento Básico.
“É um conjunto relativamente modesto de reformas dado o quadro que o País se encontra: sem capacidade de investimento público em decorrência do quadro fiscal, alta carga tributária e taxas de juros relativamente altas em relação aos países desenvolvidos”, afirma Tenório.
De acordo com Pedro, uma vez controlada a inflação (pelo aumento da taxa Selic e pelo Teto de Gastos) em 2017, foi possível diminuir a Selic. Outro ponto reforçado por ele, foi o fraco desempenho econômico desde então (entre 2017 e 2019 a média de crescimento anual ficou abaixo 1,5%, após perda de mais de 7% do PIB em 2015 e 2016), o que permitiu cortes adicionais da taxa visando maior estímulo à economia.
“Em 2018, a meta da taxa Selic atingiu seu primeiro recorde de baixa histórica: 6,5% ao ano em março. A taxa Selic continuou caindo até fevereiro de 2020 ao nível de 4,25%, antes da pandemia chegar ao Brasil”, explica o economista.
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A pandemia pode ter funcionado como impulso adicional para queda da Selic até o nível mais baixo da história, 2% ao ano, determinado pelo Copom do dia 05 de Agosto de 2020, visto que a falta de dinamismo econômico continuou sendo a razão do movimento de queda da taxa. Para explicar, o economista da DataZAP+ divide a pandemia em dois momentos.
“No primeiro momento, vemos países no mundo inteiro diminuindo suas taxas básicas de juros para estimular a economia, como fez o Copom aqui no Brasil. Em um segundo momento, a partir do fim de 2020, a inflação começou a aumentar globalmente devido aos estímulos econômicos em nível internacional concomitantemente à reorganização das cadeias de produção globais”, explica. Segundo análise do especialista, é possível dizer que a reação econômica à pandemia e o distanciamento social por ela imposto alavancou a inflação a partir de 2021.
Quando a Selic aumenta, o custo de dar crédito também sobe. Sabemos que quanto maior o preço ofertado, menor o volume vendido, o que implica que um aumento da taxa Selic diminui o volume de crédito concedido, desacelerando ou até diminuindo a atividade econômica. “Este é um efeito geral para a economia toda, afetando o mercado imobiliário indiretamente, via renda das famílias”, diz Pedro.
Conforme dito pelo especialista,a taxa também afeta o mercado imobiliário diretamente por meio das taxas de juros de financiamentos imobiliários. “O imóvel é um bem cujo preço é um múltiplo da renda mensal das famílias. Para a maior parte delas é inviável comprar um imóvel sem passar pelo mercado de crédito”, afirma Tenório.
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Como o financiamento imobiliário é uma operação bancária de crédito, um aumento da Selic pressiona as taxas de juros de financiamentos imobiliários a também aumentarem. Crédito mais caro, menos concessão – o que freia o mercado imobiliário residencial de compra e venda.
Em resumo, é possível entender de duas formas como acontece:
Segundo Pedro, faz sentido que as taxas de juros de financiamentos imobiliários reajam a mudanças na Selic numa proporção menor e com atraso temporal. “Apesar da taxa Selic ser um custo comum a todas operações bancárias de crédito, cada operação tem suas peculiaridades. No caso de financiamentos imobiliários, a operação conta com uma série de particularidades devido à importância do mercado imobiliário dentro da economia e da sociedade”, comenta.
Para explicar melhor, Pedro apresenta um exemplo: parte dos recursos da caderneta de poupança são obrigatoriamente destinados a financiamentos imobiliários por lei. Além disso, a maior parte dos financiamentos é feito com a taxa de juros fixa, indexada à TR (taxa referencial) e com um prazo bastante longo, o que reflete na operação.
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“Na linguagem do economês, dizemos que o aumento da Selic pressiona as taxas de juros de financiamentos: pressiona porque é difícil determinar com precisão quanto e quando a taxa para financiamentos vai aumentar, embora haja certeza da direção”, diz.
“Muitas pessoas se perguntam porque ter uma taxa de juros básica, que afeta toda a economia.
O intuito é que a Selic seja justamente um instrumento para que o Banco Central possa influenciar a economia”, explica.
Neste momento, a economia brasileira está desaquecida, com baixo crescimento do PIB, desemprego e inflação também em alta. O Banco Central pode diminuir a taxa Selic e estimular a economia. Caso a economia esteja demasiadamente aquecida, com inflação crescente e acima da meta, o Banco Central pode aumentar a taxa Selic e desestimular a economia, a fim de que ela volte para um equilíbrio sustentável.
“Inflação é a perda de poder de compra. Em geral, falamos da inflação ao consumidor, isto é, do poder de compra que o consumidor perdeu. A inflação é o fenômeno ilustrado pelo exemplo já típico do mercado”, diz Tenório.
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O que se comprava em um período anterior com R$200,00, em relação ao que se compra hoje significa a inflação do período. Para Pedro, geralmente o mercado usa o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) para medir a inflação ao consumidor, já que o IPCA é o índice de inflação oficial do País, usado pelo Banco Central para perseguir a meta de inflação.
O IPCA acompanha o preço médio da cesta de bens para famílias de 1 a 40 salários mínimos nas regiões metropolitanas de Belém, Fortaleza, Recife, Salvador, Belo Horizonte, Vitória, Rio de Janeiro, São Paulo, Curitiba, Porto Alegre, além do Distrito Federal e dos municípios de Goiânia, Campo Grande, Rio Branco, São Luís e Aracaju.
Tenório reforça que o Comitê de Política Monetária (Copom), em conjunto com o Banco Central do Brasil, utiliza a Selic como instrumento econômico para perseguir a meta de inflação. Abstraindo das complexidades, funciona da seguinte forma: “Se a inflação, medida pelo IPCA, estiver acima da meta, o Banco Central aumenta a Selic, diminuindo o dinamismo do mercado de crédito, o que vai desacelerar a economia como um todo, o que por sua vez refletirá numa desaceleração da inflação”, comenta.
Caso a inflação esteja abaixo da meta, o Banco Central diminui a Selic visando aumentar o dinamismo no mercado de crédito, o que estimulará a economia e implicará no aumento da inflação.
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“Afeta quem compra e quem constrói, no caso, quem precisa de crédito no País”, afirma Pedro, já que grande parte das construtoras e incorporadores trabalham com crédito para as obras, portanto, sua disponibilidade e preço (taxa de juros), ambos sensíveis à Selic, são fundamentais para os agentes da incorporação e construção de novos imóveis.
Para Selic voltar a um patamar mais baixo, Tenório explica que é necessário a consolidação de um quadro institucional de responsabilidade fiscal. Ou seja, é necessário que as instituições brasileiras garantam que o País tenha perspectiva de curto, médio e longo prazo de pagamento de sua dívida.
“Mesmo assim, voltar ao patamar dos 2% ao ano parece improvável. Majoritariamente, os analistas esperam a Selic entre 5% e 8% ao ano em 2024/2025, refletindo o que seria um patamar natural”, afirma Tenório.
Porém, segundo o especialista, é difícil dizer quando deve começar o ciclo de normalização da taxa, dada a grande incerteza fiscal que as eleições deste ano estão carregando. O caráter da proposta fiscal eleita neste ano será fundamental para determinar quando a Selic começará a cair e qual patamar ela atingirá.
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A taxa básica de juros de uma economia, a Selic no nosso caso, é uma das variáveis mais importantes da economia. “Primeiro, pelo seu efeito direto no mercado de crédito: financiamentos imobiliários tendem a ficar mais baratos, como financiamentos de automóveis e outras modalidades de crédito”, comenta.
O ciclo virtuoso no mercado de crédito desencadeia efeitos tão importantes quanto o originário: a expansão do crédito é acompanhada usualmente por aumento nos investimentos e renda. Então sim, a Selic em patamar menor é positiva para toda a economia (claro, desde que haja condições econômicas para isso).