No início deste ano, enfrentei um enigma que muitos de nós que trabalhamos em casa conhecem bem: em qual lugar posso realmente trabalhar? A menos que você seja abençoado com um imóvel grande o suficiente para ter um escritório dedicado – ou que seja um trabalhador verdadeiramente nômade, capaz de se instalar em um sofá com nada mais do que uma xícara de chá e seu laptop –, inevitavelmente terá que moldar o espaço da sala, que não é naturalmente destinado ao trabalho.
Qualquer ponto escolhido tem o potencial de diminuir o que você tinha antes. Se resolver acampar no quarto, terá de encarar sua mesa enquanto tenta dormir, com todos aqueles e-mails não respondidos chamando por você, que segue acordado às 4h da manhã. Ir para a cozinha ou para a sala tomar um lanchinho se torna um vai e vem infinito – por que trabalhar quando você pode provar a salsa fresca da feira? Roube um canto da sala de estar e, de repente, sua principal área social parece uma estranha sala de descanso do lado de fora de um cubículo de escritório.
Essas eram as minhas opções quando abandonei meu escritório arejado e cedi o espaço para meu filho, quando ele saiu do quarto que compartilhava com a irmã. Eu sabia que esse dia chegaria, mas quando aconteceu eu ainda não tinha uma boa solução sobre onde me instalar. Então fui para o lugar onde todos os objetos sem localização óbvia vão: o porão.
Eu me convenci de que poderia funcionar e arrumei a sala com tantos detalhes convidativos quanto pude reunir. Instalei novos pisos e tirei o teto para expor as vigas de madeira, acrescentando altura e dimensão ao espaço. Pintei a sala de cor clara e instalei iluminação embutida, transformando parte do espaço em uma aconchegante sala de TV para a família. O resto seria meu. Comprei um difusor de aromaterapia, enchendo o ar com o cheiro de citros e alecrim. Ocupei as prateleiras embutidas com livros e fotografias. Eu até tinha uma janela! Quão ruim poderia ser?
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No final, foi a janela que me pegou. Com metade do tamanho de uma janela comum e posicionada acima da minha cabeça quando eu estava sentada, a abertura fornecia uma visão desobstruída das costas de um arbusto. Se esticasse meu pescoço, poderia até ver o céu e vislumbrar brevemente a luz do dia, não muito diferente de um prisioneiro em uma masmorra medieval.
Cada vez mais os americanos estão trabalhando remotamente, seja teletrabalho, seja freelancer. Quase um quarto dos empregados de tempo integral trabalhava de casa pelo menos parte do tempo em 2018, de acordo com o Bureau of Labor Statistics. No entanto, nossos espaços domésticos geralmente não refletem nossa ânsia de sair do escritório, deixando-nos insatisfeitos com o que poderia ser uma ótima configuração.
Claro, é bom não ter que se vestir e pegar o trem todas as manhãs. Mas o arranjo pode rapidamente perder seu brilho. Um estudo de 2015 publicado no periódico “Ciência Psicológica de Interesse Público” descobriu que o teletrabalho pode confundir os limites entre a vida profissional e a vida familiar, levando a conflitos familiares ao mesmo tempo em que deixa os trabalhadores se sentindo social e profissionalmente isolados. Você sabe o que é isolamento? É sentar sozinho o dia todo em um porão, acompanhado apenas pelo ronco baixo da caldeira.
Em “Meu espaço criativo: como projetar sua casa para estimular ideias e incentivar a inovação”, um livro a ser publicado em outubro de 2019, o arquiteto Donald M. Rattner argumenta que não damos aos espaços de trabalho toda a atenção que merecem, enquanto deveríamos pensar na nossa casa inteira como um veículo criativo, projetando-o com cores, luz, música e arte que visam inspirar. “As pessoas fazem muitas coisas contraditórias sem perceber que não contribuem para um bom espaço de escritório”, disse Rattner.
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Muitas vezes encontramos soluções meia-boca para nossas necessidades de trabalho, como converter um armário – sim, um closet – em um escritório. Esvazie-o, empurre uma mesa pra dentro dele e voilà: você tem um escritório em casa. “Seu espaço mental se contrai em proporção direta ao seu espaço físico”, disse Rattner sobre essa configuração. “Sua mente vai estreitar.”
Mas às vezes são suas opções que são estreitas. Quando Savannah Ashour, de 41 anos, escritora e redatora, mudou-se para um apartamento em Los Angeles há cinco anos, não tinha certeza de quanto tempo estaria trabalhando como freelancer, então não queria investir muito tempo e dinheiro criando um escritório em casa. Sua cozinha ensolarada tinha uma janela de frente para uma árvore de jacarandá e era grande o suficiente para espremer uma escrivaninha, uma cadeira giratória e uma mesa. De costas para o resto do apartamento, ela podia esquecer que estava em casa e se concentrar.
No ano passado, muito depois que ficou claro que isso não era um arranjo temporário, ela se comprometeu com o espaço. Fez um upgrade para uma escrivaninha branca e comprou um tapete alegre vermelho e laranja para definir o espaço. Em vez de comprar uma cadeira de escritório tradicional, que ela achava que seria uma monstruosidade em um apartamento minúsculo, ela optou por um banquinho onde pudesse sentar, inclinar-se ou afastar-se para ficar em pé.
“Existe algo sobre estar trancado em um apartamento sozinho para trabalhar que meio que te faz criar benefícios extras”, tornando o espaço esteticamente agradável e roubando os melhores ativos da casa, como a janela de frente para uma árvore gloriosa. “Pelo menos você sente que há um bom compromisso para todos os desafios que surgem ao trabalhar em casa.”
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Depois de três meses enclausurada na minha masmorra do porão, meu quarto começou a parecer uma opção muito mais atraente, apesar de todos os avisos de que isso arruinaria a serenidade do meu espaço para dormir. Em uma tarde particularmente triste, arrastei minha escrivaninha para cima, acomodando-a na parede oposta. De costas para a cama e de frente para uma janela, quase podia esquecer onde estava.
Compartilhar seu escritório com o quarto traz novos desafios. De manhã, sou frequentemente cumprimentada por uma camisa descartada, jogada na minha cadeira pela minha cara metade, ou por um copo vazio de água na minha mesa. Quando entro no quarto, é difícil não notar o enorme monitor de computador olhando para mim – dificilmente uma estética reconfortante. Esses inconvenientes servem como lembretes diários de que essa ainda é uma medida temporária – uma melhoria do submundo escuro, mas não igual ao espaço encantador que eu tinha antes. O jogo de reavaliação parece distante de terminar enquanto olho outras partes da casa procurando por um cantinho mais perfeito.
Ou quem sabe, com algumas modificações, o escritório do meu quarto possa ficar bom o suficiente. Anjie Cho, arquiteta de interiores e designer de feng shui, mantém seu escritório em casa, dizendo que o arranjo, embora não seja o ideal, é comum. Ela sugeriu que eu cobrisse o monitor com uma echarpe à noite, que pendurasse uma cortina ou adicionasse uma tela para separar a área de dormir do espaço de trabalho. Eu duvido que uma tela funcione, já que isso significaria perder a luz para o resto do quarto, mas um lenço sobre o monitor parece bastante simples.
A chave, disse Cho, é dar ao ambiente a atenção que ele merece. “Se você tem um escritório em casa e leva a sério sua carreira, então precisa encontrar uma maneira de conseguir algum espaço.”/ TRADUÇÃO DE ELENA MENDONÇA
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