O mercado de finanças sustentáveis vem atingindo marcas generosas. Dados da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (Unctad) mostram que entre 2020 e 2021 houve um aumento de 63% nos recursos movimentados em produtos financeiros voltados para a sustentabilidade, como os fundos verdes. Em números redondos, um volume de R$ 5,2 trilhões.
Na outra ponta, entretanto, onde está quem precisa de financiamento para desenvolver ações a favor das pessoas, como os poderes públicos municipais, a irrigação financeira em fundos verdes ainda é escassa, apesar de ter melhorado nos últimos anos, principalmente por causa da atuação de bancos de desenvolvimento subnacionais ou agências de fomento de programas socioambientais.
“O ponto central hoje é a estruturação de bons projetos. Também é preciso uma visão moderna de financiamento, em que a questão essencialmente política fique de lado. Precisamos desenvolver uma governança típica do século 21 e juntar o público e o privado em iniciativas a favor do desenvolvimento e da inovação”, afirma Sergio Gusmão Suchodolski, presidente da Desenvolve SP.
Entre várias outras iniciativas, a agência paulista vem financiando projetos que vão colaborar com a despoluição do Rio Pinheiros e com a diminuição do desperdício de água. “É uma tecnologia que monitora vazamentos direto no cano”, explica Suchodolski. Para o gestor, com passagem também pelo Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG), aquele quadro que existia nos anos 1980 e 1990, época na qual os bancos de desenvolvimento foram liquidados pelo Banco Central, por terem servido aos políticos, precisa acabar. “A postura hoje é outra”, garante.
Publicidade
Do lado do gestor público municipal, conforme discutido durante o Fórum Anual 2022 da Aliança dos Bancos Subnacionais de Desenvolvimento da América Latina e do Caribe, realizado na semana passada no prédio da Fiesp, saber onde estão as linhas de financiamento para infraestrutura verde ou programas que enfrentem as mudanças climáticas globais, como a eletrificação do transporte público, é apenas parte do problema.
O desenvolvimento de ferramentas transversais, além de cursos de capacitação, para que o risco climático seja corretamente incorporado nos projetos é essencial – e em cidades brasileiras, as inundações e os deslizamentos entram nesse pacote, além de vários outros problemas. “É preciso que ocorra uma transformação do processo tradicional de crédito. Risco climático é risco sistêmico. As incertezas estão em como e quando esses riscos vão ocorrer”, afirma Laura Albuquerque, gerente técnica da startup Waycarbon.
Não que iniciativas positivas não estejam pipocando pelo Brasil, como explica Henrique Evers, gerente de Desenvolvimento Urbano da World Resources Institute –WRI Brasil. Segundo ele, cidades como Teresina, Manaus e São Luís estão fazendo pelo menos em parte a lição de casa. No caso da capital do Piauí, o Plano Diretor de Ordenamento Territorial do município, aprovado pelos vereadores em 2019, apresenta uma perspectiva contemporânea de cidade, segundo Evers.
O novo texto traz instrumentos inovadores para o financiamento de intervenções urbanas e incorpora estratégias para construir uma cidade mais compacta e conectada, com aproveitamento eficiente de infraestruturas e acesso às oportunidades. São os preceitos para uma cidade 3C: compacta, conectada e coordenada.
Publicidade
Se de um lado existem as instituições financeiras que precisam mudar a postura em relação aos programas que envolvem riscos climáticos, do outro, gestores têm que saber da importância de apresentar os processos de mitigação envolvidos com determinado projeto, avaliam os especialistas. Por exemplo, qual a chance de uma determinada rodovia inundar todo o verão? Ou até que ponto um município mais rural terá impactos econômicos significativos caso uma grande seca atinja a região?
“Todos os lados precisam de ferramentas que ajudem na mudança de cultura, de visão do mundo mesmo. No caso essencialmente urbano, muitas vezes, falta entendimento do que é infraestrutura urbana de qualidade e isso é um gargalo importante para se buscar soluções inovadoras”, afirma Evers.
O especialista não tem dúvidas em afirmar para os gestores públicos: “Planejamentos estratégicos alinhados com os objetivos de desenvolvimento sustentável (são 17 itens formatados pela ONU que precisam ser cumpridos em menos de uma década) são vantagens competitivas na captação de recursos.”
A matéria foi publicada anteriormente em:
https://sustentabilidade.estadao.com.br/noticias/geral,distancia-cidades-sustentaveis-comeca-a-encolher,70004130735
Publicidade