Crédito: Comeback Images/AdobeStock
O Brasil vive o século da longevidade. Em 2022, já eram 22,17 milhões de pessoas com 65+ (10,9% da população), 57,4% a mais que em 2010; a curva segue ascendente e, nesta década, os idosos devem superar o número de crianças. Esse pano de fundo demográfico não é apenas estatística: é diretriz urbana, social e de mercado.
Em sua pesquisa sobre residenciais para idosos, Rodolfo Pires de Albuquerque, diretor médico corporativo do Grupo Notredame Intermédica, chama atenção para o elo invisível do sistema:
“Hoje o Brasil conta com 5 milhões de cuidadores informais que cuidam de pacientes, principalmente clínicos, na residência. A maioria são mulheres (esposas ou filhas) e, ao contrário de países com renda semelhante, não têm suporte do governo. O Brasil cuida muito pouco dos seus cuidadores.”
Com famílias menores, mulheres plenamente inseridas no mercado de trabalho e expectativa de vida maior, o cuidado “doméstico” se torna insustentável. É nesse contexto que o sênior living deixa de ser nicho para virar ecossistema de vida ativa — moradia que integra autonomia, propósito e suporte proporcional à necessidade.
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Há lições claras lá fora. No Japão, o Long-Term Care Insurance cobre 70% a 90% dos custos (a depender da renda) e viabiliza cuidado domiciliar e institucional, abrindo espaço para milhares de profissionais mulheres no setor. Na base, três diretrizes de projeto: natureza para dentro (jardins, varandas, luz natural), espaços de convivência (salas, bibliotecas) e materiais acolhedores (bambu, madeira) — combinação que qualifica a experiência de moradores, famílias e equipes.
A médica Vânia Assaly, representante da International Longevity Alliance no Brasil, diz que o envelhecer deixou de ser idade e passou a ser funcionalidade (mover-se, pensar, pertencer).
“O sênior living contemporâneo não é um lugar para esperar o tempo passar, mas um ambiente de vida ativa que combina autocuidado, suporte profissional e convivência. É onde saúde, propósito e pertencimento se encontram”, afirma.
Para ela, o ambiente é agente terapêutico: luz, sons, aromas, natureza e arte modulam a biologia; a “arquitetura do envelhecer” previne quedas, reduz estresse e estimula movimento. O desafio brasileiro? Tropicalizar os bons modelos — com calor humano, alegria e convívio intergeracional.
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O tamanho da oportunidade é inequívoco: a participação de 60+ na população saltou de 8,7% (2000) para cerca de 15,6% (2023), e o grupo 65+ já somava 10,9% em 2022, pressionando por moradias adequadas e serviços de cuidado escaláveis.
O setor precisa inovar. Em um ambiente de Selic em 15% a.a. (set/2025), linhas tradicionais encarecem projetos e mensalidades. Para o consumidor 60+, há particularidades: no financiamento habitacional, a regra de mercado e securitária limita idade e prazo a 80 anos e 6 meses — o que encurta prazos e eleva parcelas na faixa sênior.
Existe uma janela de oportunidades para modelos híbridos de funding para sênior living (moradia + serviços), combinando:
Os novos projetos de sênior living precisam ir além da unidade privativa. Sem soluções robustas de convívio e novas teses de crédito, não haverá democratização à altura da demanda. Em um país que “cuida pouco de seus cuidadores”, como retornou Dr Rodolfo, cuidar do desenho financeiro é tão essencial quanto desenhar a planta.
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A longevidade já chegou — falta o mercado abrir porta e mesa para que envelhecer com dignidade seja acessível, sustentável e, sobretudo, vivido junto.