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[OPINIÃO] O que falta para o Faixa 4 destravar o mercado de médio padrão?

"O Faixa 4 do Minha Casa, Minha Vida representa um avanço estrutural importante para o setor imobiliário"/ Crédito: AlfRibeiro/AdobeStock
Ebran Theilacker
11-12-2025 - Tempo de leitura: 4 minutos

O segmento de empreendimentos de médio padrão no Brasil enfrenta hoje dois grandes desafios que afetam diretamente sua capacidade de crescimento. De um lado, as altas taxas de financiamento acabam inviabilizando muitos negócios para o comprador, que precisa dispor de maior capital próprio para adquirir um imóvel.

De outro, o setor ainda depende fortemente do saldo da caderneta de poupança, que vem encolhendo ao longo dos últimos anos. Dados do Banco Central mostram que a poupança acumula resgates líquidos superiores a R$ 200 bilhões nos últimos quatro anos. Apenas em maio de 2025, a saída líquida foi de R$ 10,3 bilhões. Desde o início de 2024, o total supera R$ 100 bilhões.

Além disso, a educação financeira do brasileiro evoluiu, abrindo espaço para aplicações mais rentáveis, o que reduziu os recursos disponíveis para o financiamento imobiliário. A combinação desses fatores pressiona o segmento, dificultando tanto a venda de unidades quanto a contratação de novos empreendimentos.

Nesse cenário, o faixa 4 do Minha Casa, Minha Vida surge como uma resposta estratégica, voltada justamente para atacar esses dois pontos críticos. Direcionado a imóveis entre R$ 350 mil e R$ 500 mil e para famílias com renda mensal entre R$ 8,5 mil e R$ 12 mil, o programa estabelece uma taxa de juros de 10,5% ao ano, mais competitiva quando comparada a média do mercado, que flutua entre 12 e 13%.

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Mas seu diferencial mais relevante está no modelo de funding: além dos recursos da poupança, passa a contar também com aportes do Fundo Social do Pré-Sal, uma estrutura análoga ao FGTS dentro do MCMV. Essa medida desperta como grande inovação e diferencial, criando uma fonte de financiamento recorrente e compulsória, fortalecendo o médio padrão não apenas no presente, mas também no futuro, ao abrir precedentes para novas soluções de crédito no setor.

Em 2025, foram destinados R$ 30 bilhões para esse mercado, o dobro do volume financiado em 2024, que foi de R$ 15 bilhões, mas sua utilização ainda é pouco relevante. Um dos motivos é que o valor do teto para imóveis foi fixado em R$ 500 mil, quantia que, segundo dados da Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (ABRAINC), atende apenas parte do médio padrão, sendo a faixa inicial da classe média.

Em São Paulo, por exemplo, seria somente possível comprar uma residência de até 50m². Por isso, o setor pleiteia ajustes: imóveis de até R$ 650 mil, que ampliaria para imóveis de 64m²; e renda familiar de até R$ 15 mil.

De fato, o desempenho inicial ainda é modesto: embora a expectativa fosse de 120 mil unidades comercializadas no ano, o Faixa 4 fechou o segundo trimestre com cerca de 10 mil unidades vendidas, abaixo do previsto. Os resultados ainda não decolaram justamente por causa da necessidade de ajustes estruturais. Ou seja, há um grande potencial, mas ainda é preciso calibrar os caminhos.

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O potencial, no entanto, é reconhecido pelo setor. Uma pesquisa realizada pela Brain em parceria com a ABRAINC mostra que 60% das incorporadoras veem o Faixa 4 como uma oportunidade de negócio. Além disso, 59% das empresas já planejam lançar produtos voltados para essa faixa nos próximos anos, sendo que 36% pretendem fazê-lo em até 12 meses, 19% em até 24 meses e 4% em mais de dois anos.

O levantamento também revela diferenças conforme o porte das empresas. Entre as que faturam acima de R$ 500 milhões, 59% devem lançar novos projetos em até 12 meses. Já nas de médio porte, com faturamento entre R$ 26 milhões e R$ 100 milhões, 39% não pretendem atuar nesse mercado, embora 26% tenham planos em até 24 meses.

Nas companhias de menor porte, até R$ 25 milhões de faturamento, o interesse se concentra no médio prazo, com 28% prevendo lançamentos em até dois anos.

O Faixa 4 do Minha Casa, Minha Vida representa um avanço estrutural importante para o setor imobiliário, ao combinar recursos da poupança e do Fundo Social do Pré-Sal em um modelo de funding mais robusto. Apesar da taxa de juros ainda elevada e da redução do saldo da poupança, o programa abre espaço para que incorporadoras de diferentes portes avaliem suas operações e se adaptem a essa nova modalidade de financiamento.

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A expectativa com a ampliação de famílias atendidas pelo programa é que resulte no fortalecimento do mercado de médio padrão e na criação de novas oportunidades para o setor da construção civil. Por isso, é fundamental que as incorporadoras façam uma reflexão interna, avaliando se sua cultura, seus processos e seus conhecimentos estão alinhados a essa nova modalidade.

É necessário saber aproveitar plenamente o potencial dessa forma de financiamento imobiliário e se posicionar de maneira competitiva dentro do Faixa 4.