Crédito: AdobeStock
Logo na minha vez de ser adulta, a Selic está em 15%, sem previsão de queda. O que poderia ser um meme é a realidade econômica. E se o mercado imobiliário já parece inacessível para muitos, fica ainda mais complexo quando analisado sob a ótica da representatividade de gênero e raça.
Minha última coluna aqui no Estadão Imóveis gerou reflexões que me fizeram pensar com ainda mais profundidade sobre o meu papel como colunista e como presidente do Instituto Mulheres do Imobiliário.
Há seis anos, venho construindo um movimento que amplia vozes, conecta trajetórias e promove o protagonismo feminino no setor — com consistência, estratégia e impacto real. Parte desse compromisso é praticar a escuta ativa: ouvir a audiência, acolher críticas legítimas e transformar essa escuta em conteúdo mais plural, mais representativo e mais transformador.
Foi em um desses comentários que conheci e me aproximei ainda mais de Cinara Santos, educadora financeira e mentora conhecida como Cina Prospera. Nossa conversa abriu espaço para ampliar a visão sobre investimentos no setor, e convidei também a atriz, produtora e investidora Maria Gal para aprofundar o debate.
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Duas mulheres que pensam, constroem e investem no mercado imobiliário de forma estratégica, criativa e com visão de futuro. Suas histórias não são exceções — são parte de uma nova geração de proprietárias que transformam a forma como olhamos para o setor.
Cinara começou sua jornada motivada por um desejo de autonomia: “Eu precisava ter a minha casa. Foi isso que me introduziu no mercado imobiliário — o desejo de independência e de começar a construir meu patrimônio.” Com coragem, comprou um imóvel na planta em uma cidade em expansão. O valor já dobrou. “Investir é também romper ciclos de dependência — e inspirar outras mulheres a fazerem o mesmo.”
Maria Gal, por sua vez, enxerga os imóveis como parte do seu projeto maior de impacto cultural: “Vejo o audiovisual e os imóveis como duas formas de construção de patrimônio: um simbólico, o outro concreto. Ambos exigem visão, estratégia e coragem para ocupar espaços.” Seu primeiro imóvel foi reformado e transformado em experiência de hospedagem. Hoje, ela estuda leilões, investe em locação por temporada e sonha com empreendimentos afrocentrados. “Cada imóvel que escolho também fala sobre quem eu sou e o que quero transformar.”
Confira a seguir trechos da entrevista exclusiva com elas:
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Elisa Rosenthal: Quando e como o mercado imobiliário entrou na sua trajetória como ferramenta de autonomia financeira?
Cinara Santos: A necessidade de ter independência e de iniciar o meu patrimônio.
Elisa Rosenthal: Sua trajetória é marcada pela atuação artística e empreendedora. Em que momento você percebeu que o mercado imobiliário poderia ser parte da sua estratégia?
Maria Gal: Minha decisão de empreender no setor audiovisual surgiu por sobrevivência mesmo. Como atriz negra, retinta e nordestina, eu simplesmente não encontrava oportunidades reais no mercado ou elas vinham sempre acompanhadas de estereótipos.
À medida que fui estruturando minha carreira empreendedora, percebi que eu precisava também garantir autonomia financeira. Foi aí que o mercado imobiliário entrou: comecei investindo em imóveis para locação por temporada, onde aplico um olhar estético, estratégico e de hospitalidade. Mais recentemente, tenho estudado compra de imóveis em leilões para revenda, como forma de investimento de médio e longo prazo. Vejo o audiovisual e os imóveis como duas formas de construção de patrimônio: um simbólico, o outro concreto. Ambos exigem visão, estratégia e coragem para ocupar espaços. Ambos têm retorno quando você planta com propósito.
Elisa Rosenthal: Você acompanha muitas mulheres em suas jornadas com o dinheiro. O que mais aproxima e o que mais afasta as mulheres do investimento em imóveis?
Cinara Santos: É envolvimento com segurança e autonomia. Porque mesmo quando você não compra esse imóvel como um investimento, ele é um patrimônio concreto. O que aproxima as mulheres de investir em imóveis é justamente a segurança, a estabilidade, e a autonomia de você ter uma coisa que é sua. Já o que afasta as mulheres do investimento em imóveis, é, em boa parte, o medo do endividamento.
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Elisa Rosenthal: Seu olhar criativo influencia suas escolhas como investidora? Como você avalia um imóvel além do aspecto financeiro?
Maria Gal: Meu olhar criativo influencia tudo o que faço, inclusive na hora de investir. Eu enxergo o potencial de um imóvel não só pelo retorno financeiro, mas também pela capacidade dele de contar uma história, acolher pessoas, criar experiências. Gosto de pensar se aquele espaço inspira, se comunica com a minha estética e tem conexão com o que acredito: beleza com propósito e conforto com identidade. E essa sensibilidade vem não só da minha trajetória como atriz e produtora, mas também da minha atuação como influenciadora digital.
Hoje, tenho mais de 1 milhão de seguidores nas redes sociais e venho construindo um trabalho sólido com grandes marcas, criando conteúdos que falam sobre empreendedorismo, finanças, investimento e autonomia para mulheres negras. Avalio imóveis com um olhar financeiro, mas também com uma visão de marca pessoal, posicionamento e comunicação. Porque cada escolha que faço, inclusive de onde invisto meu dinheiro, também fala sobre quem eu sou e o que eu quero transformar.
Elisa Rosenthal: Que conselho você deixaria para uma mulher que quer investir, mas ainda não se sente pronta?
Cinara Santos: Comece com o que você tem. Muita gente acha que, para começar a investir, tem que ter muito dinheiro. Não. Comece com o que você tem. E crie o hábito, né? Investir não pode ser uma coisa que ‘ah, eu vou fazer quando der’. Mas pesquise antes porque quando você não conhece o investimento, você acredita em qualquer oportunidade. E, às vezes, isso é uma armadilha.” Estude, pergunte, procure ajuda e não se intimide com o que parece técnico demais ou masculino demais. O mercado imobiliário pode e deve ser um lugar para todas nós.